quinta-feira, 27 de agosto de 2015

O Que Me Faz Pular, de Naoki Higashida


Ainda hoje, o autismo é um condição bastante desconhecida e negligenciada pela sociedade em geral. Jovens autistas são incompreendidos e constantemente taxados como retardados, problemáticos, antissociais; contudo, o que poucos conhecem verdadeiramente é a grande capacidade criativa, social e a inteligência que essas pessoas possuem e que, por ignorância daqueles que os cercam, são drasticamente suprimidas pela falta de um tratamento adequado.

Naoki Higashida é um jovem que como outros milhares pelo mundo, sofre com as consequências do autismo. Entretanto, ele é a prova viva do que falei anteriormente. Aos 6 anos foi diagnosticado com tendências autistas e passou a frequentar escolas especiais. Sofreu bastante no começo, como qualquer outro, mas com o tratamento e atenção adequados, Naoki transformou-se numa pessoa absolutamente incrível, e exemplo para muitos. Ele escreveu diversos textos de ficção e não-ficção, recebeu prêmios por eles e mantém um blog, onde divide um pouco da sua vida com o mundo. 

Naoki na época em que escreveu O Que Me Faz Pular e nos dias atuais

O maior exemplo desse brilhantismo é O Que Me Faz Pular publicado em 2007, quando o jovem tinha apenas 15 anos. Nessa obra, Naoki responde diversas perguntas que acabam por quebrar o silêncio do autismo e nos revelar o quão equivocadas são nossas percepções sobre essa condição. Juntamente com as respostas, temos alguns textos do garoto, tudo nos ajudando a ver um pouco o mundo sob os olhos dele.

Uma coisa bastante interessante sobre O Que Me Faz Pular é a forma como foi escrito. Naoki, como qualquer autista, tem bastante dificuldade em comunicar-se oralmente. Como ele próprio explica, a mente de um autista é uma bagunça, eles não tem uma ordem nas memórias, não possuem uma noção da ordem em que as coisas aconteceram, nem mesmo controle sobre suas ações. Por isso, a maioria prefere não falar, por vergonha ou por medo de falar algo idiota, ou sem sentido para os demais. 
"[...] As palavras que queremos dizer e aquelas que conseguimos dizer nem sempre coincidem. [...] Eu nunca consigo dizer o que quero de verdade. Ao contrário, palavras que não tem nada a ver com nada escapam da minha boca"
Para driblar as dificuldades de comunicação, a mãe de Naoki criou uma tábua de letras, com a qual o garoto foi aprendendo a expressar-se. O Que Me Faz Pular foi fruto do trabalho dele com o auxilio da mãe, que escrevia o que o garoto expressava através da tábua. 

As belas ilustrações que preenchem o livro são da dupla de artistas Kai e Sunny
Além dos grandes problemas de comunicação, também são abordados comportamentos que costumeiramente parecem estranhos para as pessoas "normais", formas de ver o mundo, opiniões de Naoki sobre a sua condição e sobre as ideias erradas que as pessoas tem. Inclusive, outra pergunta que me chamou bastante a atenção e inclusive me emocionou um pouco foi sobre "ficar sozinho". Muitos pensam que autistas gostam de ficar sós, são antissociais, contudo, Naoki mesmo fala que tudo é uma questão de altruísmo da parte deles.
"Não posso acreditar que qualquer ser humano deseje mesmo ser deixado só. [...] O que incomoda as pessoas com autismo é que nós ficamos muito ansiosos com o fato de causar problemas para vocês e deixá-los nervosos.[...] A verdade é que amamos ter companhia. Mas, como as coisas nunca dão certo, acabamos nos acostumando com a solidão sem querer perceber como isso aconteceu."
Uma coisa que sempre pensei e tentei praticar, não me considerando melhor por isso, é que pensar como o outro, ou tentar colocar-se em seu lugar, experimentar um pouco, mesmo que na imaginação, do que deve ser a vida do outro pode ajudar muito no entendimento, na convivência, numa vida melhor para ambos. Pelo que li, Naoki pensa da mesma forma. O trecho, que também é um pedido, faz parte do prefácio magnifico que o garoto escreveu.
"[...] Minha grande esperança é poder ajudar um pouco, explicando do meu jeito o que acontece na mente das pessoas nessa condição. [...] Não se pode julgar uma pessoa pela aparência. Mas, a partir do momento em que você entende o que acontece dentro do outro, vocês dois podem se tornar bem mais próximos. Do seu ponto de vista, o mundo do autismo deve parecer um lugar extremamente misterioso. Portanto, por favor, pare um pouco e ouça o que eu tenho a dizer."
Quanto a escrita, o livro é bastante simples e direto. As explicações de Naoki nos fazem sempre refletir sobre aquilo que é abordado. Eu mesmo criei uma certa rotina de 5 ou 10 perguntas por dia para ter tempo de pensar sobre o assunto e tirar minhas conclusões. Além de tudo, a introdução de David Mitchell, autor e responsável, juntamente com sua esposa, pela adaptação da obra para o inglês, nos faz mergulhar de forma sutil nesse universo do autismo, nos dando uma certa noção do que veremos pela frente e dos impactos que o livro de Naoki deixou na própria vida do autor e do relacionamento com seu filho, que também possui autismo.

Sem sombras de dúvidas, O Que Me Faz Pular é um livro incrível, profundo e esclarecedor. Todos deveriam ter o prazer, e a vontade, de lê-lo e poder tirar da cabeça tantas conclusões erradas, tanta coisa que na maioria das vezes só piora a condição de um autista, que só o deixa mais deprimido e solitário. Um livro absolutamente perfeito para quem busca entender o autismo de uma forma real e próxima.



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